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domingo, 24 de junho de 2012

Monstros marinhos sustentam a mitologia oceânica


Monstros marinhos sustentam a mitologia oceânica
Em suas águas existe um verdadeiro mundo à parte, e em suas profundezas
jazem ainda assuntos, se não fantasiosos, pelo menos desconhecidos dos homens.
                                                            
Por Fabiano Mauro Ribeiro*
Do Rio de Janeiro-RJ

Antiga ilustração mostra uma serpente marinha devorando um homem.

Miragens oceânicas?

A divisão da natureza em quatro elementos, fogo, terra, água e ar, recebeu a acolhida dos filósofos estóicos. Mas beligerantes não filósofos, pós Era Industrial, declinaram da quaternidade e, para efeito de guerra disseram, “terra, mar e ar”. O mar entraria nessa tríade como potência auxiliar nas conquistas.

Em suas águas existe um verdadeiro mundo à parte, e em suas profundezas jazem ainda assuntos, se não fantasiosos, pelo menos desconhecidos dos homens.

Aristóteles já falara em uma serpente marinha monstruosa capaz de “se enroscar numa trireme e destroçá-la”. O francês Gautron (“A Verdade Sobre a Grande Serpente Marinha”, 1905), fala sobre esse e outros mitos dos mares, mostrando que  essas histórias cresceram a partir do século XVI ao XVIII. Talvez, as causas seriam o fortalecimento e a evolução da navegação. O século XIX, segundo Bernard Henelmens (“Le Grand Serpent de Mer”) marca o aumento efetivo das aparições. Contam-se algo em torno de 300 vezes. No século XX até 1980, quando Robert de La Croix, fez  pesquisas significativas, mais de 200 notícias foram catalogadas. Pode ser comparado ao fenômeno dos avistamentos de OVNIs.

Há relatos de cobras gigantescas da cor de chumbo, surgindo sempre entre os mares do Atlântico e Pacífico. A coloração pode variar do chumbo ao negro, do negro ao amarelo – já se falou do branco ou de um rajado de vermelho. Alguns as classificam como verdadeiros demônios, bizarros assustadores, mas via de regre, não agressivos. Tripulações surpreendidas usam, por isso, orações de exorcismo.

Canhoneiras e o Leviatã

Num dia cinzento de 1896, a Canhoneira Avalanche, tenta na Baía de Along, perseguir uma suposta dupla de monstros marinhos. O evento gera relatório com testemunhas, mas falou-se que tudo teria sido arquivado, como prova de uma reação armada contra o fantástico. Ocorre, porém que a mesma canhoneira, um ano depois comandada por Agresille, presencia a mesma visão. O Comandante afirma que avistara um  leviatã, mas optara por não persegui-lo. O monstro foi descrito em detalhes como “medindo cerca de 30 metros, pele lisa e brilhante, forma arredondada, movimentos ondulatórios na vertical”. O animal, ao final do bailado assustador, teria soltado um jato de vapor em direção ao barco.

A velha Canhoneira Avalanche reincide, e uma semana depois, transportava pessoas ilustres para  as Ilhas Fai-Tsi-Long, quando foi avistada a tal serpente. O fato foi logo avisado por um marinheiro a todos os presentes. Segundo De La Croix (“História Secreta dos Oceanos”) lavrou-se até mesmo um auto, mas tudo foi encerrado, com medo do pânico ou do ridículo.

Igual passagem teria presenciado a Canhoneira Decidée, que avistaria  um monstro de 20 metros, “semelhante a um réptil de pele castanha rugosa”. Vista de perto, a fera mostrava uma cabeça triangular, com olhos franzidos. Expelia “água vaporizada em direção ao barco”.

Serpente marinha - obra do artista plástico Roger Dean.

Mais monstros marinhos

Em 1915 o submarino alemão U-28 torpedeou o cargueiro inglês Iberian. Devido à explosão e afundamento do navio, formou-se no lugar um  gêiser  (onda de vapor e gases) e entre os destroços que boiavam no meio da bruma, surgiu o grande réptil, visto por toda a tripulação do feroz U-28 que julgou tê-lo ferido.

Em maio de 1917, homens do cruzador Ilary, avistaram uma grande serpente, com as costumeiras características já narradas. Houve uma tentativa - sem se saber o resultado - de atingi-la com um tiro de obus.

Os tripulantes do cargueiro Saint-François-Xavier, se encontravam na Costa Leste da Austrália em 1925 e juram terem avistado um enorme réptil, cujo diâmetro descreveram como igual ao de  “grandes barricas bordalezas”. Houve choro e orações no navio. O monstro mergulharia, para aparecer depois bem nítido com seu corpo de mais de 15 metros e formado por vários anéis.

Outras visões desse tipo vão sendo observadas no decorrer do século XX. Os responsáveis pela condução do  paquete Santa Clara já em 1947, a caminho das Antilhas, teriam se defrontado com uma gigantesca serpente. Ela teria se erguido em frente à embarcação – porém o navio abalroou o corpo imenso, que desapareceria, deixando um rastro de sangue.

As características das visões são repetidas – animais com  as mesmas semelhanças e feições. Contudo, é pitoresco e intrigante notar que há sempre a afirmação dos visionários de que tais seres são de bom humor e estariam prontos a fugir, ante à menor reação.

Uma nota que merece um recuo de data consta de registros históricos, em 8 de julho de 1876, teria ocorrido em terras brasileiras. Naquela data, tripulantes da brigue Pauline, no Cabo de São Roque, teriam assistido por longo tempo uma luta entre uma serpente marinha e um cachalote, sendo que esse último terminou por ser torturado pela antagonista “que possuía grossos anéis” (também pesquisado por Robert de La Croix).

A fraude de Le Serret

Como em toda literatura de mistérios ou supostos mistérios, existe a fraude notória, até com  pitada de certo humor. O autor mencionado, que aprofundou com esmero os socavões dessas fábulas, narra que o francês  R. Le  Serret, que compararíamos a um Amyr  Klink  às avessas, apareceu com uma eletrizante história, já na era da fotografia e do cinema, na década de 1930.

Le Serret alardeou que se tornara náufrago em seu périplo em torno da Grande Barreira de Adelbran. Náufrago privilegiado, conseguiu sobreviver com uma filmadora. Uma vez alcançada uma pequena ilha, Le Serret, às tantas da noite, teria avistado uma serpente de grande porte, com dois olhos saltados numa cabeça oblonga. Com a filmadora, ali estaria a prova a que a ciência daria boas vindas, e o francês a filmou.

No seu retorno à França houve grande ansiedade – a imprensa fervilhava em torno dele, embora peritos sempre se mantivessem no silêncio do ceticismo. O francês revelou o filme, mas o que se viu foi algo risível: um biólogo identificou a filmagem (feita a curta distância) de um animal conhecido como “bicho de sete cabeças”. O mesmo é encontrado nos costões daquela região.

Mito que atravessa séculos

Toda a trajetória do mito das serpentes marinhas se assemelha no seu mecanismo, ao de outros conhecidos, com, o do Yeti (O Abominável Homem das Neves), para se citar somente um exemplo. Até o presente não se conseguiu um cadáver de serpente, o que leva a maioria dos observadores a optar pela hipótese de fenômenos alucinatórios.

Como todos os mitos, o das serpentes marinhas, precisa existir na mente da gente do mar. É preciso haver hora e local certo para visões e, contra elas, como tudo que é mitológico, jamais haverá uma prova científica.

Bernard Henelmens opina em sua acurada obra que, finalmente, a lenda surgiu pouco a pouco da observação fugaz de toda uma série de animais marinhos de grande porte.

A sensatez e a análise fria matam os sonhos e afugentam assombrações.

*Fabiano Mauro Ribeiro é pesquisador de historia e arte, e colaborador de Via Fanzine.

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